Fordlândia

INTRODUÇÃO:

Através da INTEGRAÇÃO VERTICAL a FORD MOTOR COMPANY procurava produzir vários itens em busca de uma fabricação autossuficiente. E um dos seus maiores problemas estava na produção de pneus. HENRY FORD negociou com o governo do brasileiro uma área na FLORESTA AMAZÔNICA para cultivar borracha, em um núcleo na confluência dos rios Amazonas e Tapajós. O sonho foi abandonado em 1945 depois de enormes problemas: baixa produção, agitações trabalhistas e o aproveitamento efetivo da borracha sintética durante a II GUERRA MUNDIAL.

A DEPENDÊNCIA

Na década de 1920 para atender a um ritmo tão grande de produção, a FORD tinha necessidade pneus e outras partes feitas de borracha. A empresa tendo uma extrema dependência das importações do látex produzido na Ásia (um monopólio britânico) procurava uma forma mais econômica para suprir a demanda.  

Entre 1920 e 1922, o consumo cresceu de 19.400 para 67.100 toneladas. Desta maneira, objetivo era possuir a própria fonte de borracha para os pneus e peças (como válvulas, mangueiras e juntas). Em 1925, o preço da borracha natural se elevou a tal ponto que algumas empresas já estudavam métodos de produção de borracha sintética para competir com a borracha natural.

O CICLO DA BORRACHA no Brasil (1879-1912) gerou um período de grande prosperidade para a região Amazônica com a exportação de látex.

Mas, em 1876 o botânico inglês HENRY WICKHMAN contrabandeou para a Inglaterra 70.000 sementes de seringueira. Após um processo de cultivo experimental em estufas, as 7.000 mudas que vingaram foram levadas para as colônias britânicas da Ásia (Malásia, Cingapura e Ceilão). Ali não havia fungos ou insetos nocivos para as seringueiras que foram plantadas enfileiradas e organizadas em monocultura produzindo com mais qualidade e menor custo.

As condições do solo e processo de plantio apresentaram grande eficiência e alcançaram um alto volume de produção, muito diferente das condições do Brasil onde as árvores estão espalhadas pela floresta.

A queda nos preços da borracha criou uma grave crise econômica em toda a região amazônica provocando o fim do CICLO DA BORRACHA (1913), a perda de receita dos Estados e desemprego generalizado. 

O PROJETO DA FORDLÂNDIA

Portanto, a FORD não tinha o lucro esperado por sua dependência e por falta de alternativas. HENRY FORD aproveitou a pesquisa AMERICAN RUBBER MISSION,do governo americano, sobre a viabilidade de obter a borracha do Brasil (1923). Então, idealizou a construção de duas cidades na floresta amazônica, no Rio Tapajós, para não depender das importações dos imensos seringais da Malásia.

O CICLO DA BORRACHA já estava superado e para o governo brasileiro significava uma excelente oportunidade de levar o desenvolvimento para a região. Como incentivo, se estabeleceu a isenção de taxas de exportação sobre a produção local (borracha, látex, pele, couro, petróleo, sementes, madeira ou qualquer outro tipo de bem produzido). HENRY FORD comprou uma área de 1,5 milhão de hectares para produzir borracha numa negociação “ATRAVESSADA” pelo cafeicultor JORGE DUMONT VILLARES. Ele havia recebido do governo do Pará áreas em sete pontos diferentes e, quando os americanos vieram ao Brasil, VILLARES mostrou apenas os seus terrenos. E a FORD pagou U$ 125,000 por uma área com terreno montanhoso e inadequado para o plantio de seringueiras.

O INÍCIO   Em 1927 se inicia no Pará o projeto da FORDLÂNDIA, uma cidade na Amazônia para ser a fonte de borracha para produzir 50 milhões de pneus/ano e satisfazer, não só a necessidade da FORD, mas também a de outras empresas.

Dois navios vieram dos EUA com os materiais necessários para erguer a cidade. Em 1928 começou a derrubada da floresta para a construção das casas e o plantio das seringueiras próximas umas das outras com a garantia de grande produtividade.

A MÃO DE OBRA

Gente de todo o Brasil foi tentar um emprego na FORDLÂNDIA. Mas, a falta de uma mão de obra engajada foi um problema seríssimo para a COMPANHIA FORD INDUSTRIAL DO BRASIL durante todo o tempo da duração do projeto.

E a FORDLÂNDIA tinha benefícios bem avançados e de alto nível:

● Os melhores hospitais de toda a região.

● As casas dos administradores americanos eram de alto nível.

● As casas dos trabalhadores brasileiros eram mais modestas e nem por isso deixavam de ser adequadas.

● Havia campos de golfe, quadras de tênis, clube, cinema, piscinas e escolas. Tudo de acordo com o melhor do AMERICAN WAY OF LIFE.

● Os salários eram pagos a cada quinzena e muito maior dos que a região oferecia.

A empresa tinha a mentalidade americana e seguia regras americanas, às quais os brasileiros não se adaptaram. Assim, a rotatividade da mão de obra era grande. Os caboclos, acostumados ao ciclo do sol e das estações do ano, estranharam o ritmo de trabalho:

1 – O tratamento era de uma forma à qual não estavam habituados.

2 – Os horários rígidos para os turnos de trabalho e para o descanso eram marcados por sirenes e relógios de ponto. 

3 – O consumo de bebidas alcoólicas era proibido. Porém, a criatividade, a BREJEIRICE e a MALEMOLÊNCIA do caboclo brasileiro encontraram a saída: as bebidas vinham contrabandeadas em melancias vindas pelo Rio Tapajós e na outra margem havia bebida e prostitutas, vindas de Belém e Santarém (a “ILHA DOS INOCENTES”).

O QUEBRA PANELAS  

As diferenças culturais não demoraram a causar problemas bem mais sérios. Em 1930 ocorreu no refeitório uma rebelião que ficou conhecida por QUEBRA PANELAS. Os caboclos queriam peixe, farinha e feijão e se revoltaram contra a obrigatoriedade de comer hambúrguer e espinafre.

E além do mais, os trabalhadores acostumados às redes de dormir tinham que morar em casas, ao estilo americano. E eram obrigados a usar crachás.  E os encarregados, autoritários e truculentos, comandavam em uma forma a qual os brasileiros não estavam habituados.

A situação causou muitos conflitos e os trabalhadores puseram os americanos em fuga. Eles tiveram que se refugiar na selva e aguardar o resgate pelo exército brasileiro.

Aproveitando a revolta os trabalhadores também destruíram relógios de ponto, instalações e vários equipamentos.

A BAIXA PRODUTIVIDADE   O problema teve início com o ritmo lento da implantação dos seringais. Havia apenas 400 hectares em 1929 e em 1931 a área aumentou apenas para 900 (contra o plano inicial de 200.000 hectares previstos para o mesmo período rendendo 1.500 quilos por hectare). Mas, outros fatores negativos que inviabilizaram a FORDLÂNDIA:

● O solo da região era pobre pedregoso e impróprio.  

● Das sementes plantadas, 95% não germinaram.

● O total desconhecimento do plantio de seringueiras. Nenhum dos responsáveis da FORD tinha conhecimento ou experiência no assunto.

● Os americanos poderiam ter evitado grande parte dos erros que foram cometidos. Não fizeram nenhum tipo de pesquisa e nem consultaram a opinião de algum botânico.

● Os americanos também não avaliaram a força da floresta tropical para prejudicar a empreendimento.

O MAL DAS FOLHAS

Ao contrário do que acontece na floresta, onde as seringueiras crescem livremente no seu estado natural (espalhadas e espaçadas), as árvores da FORDLÂNDIA foram plantadas próximas entre si para facilitar e tornar a coleta do látex mais eficiente.

Mas, as árvores foram atacadas por várias pragas e pelo fungo do MAL DAS FOLHAS (MICROCYCLUS ULEI do gênero MICROCYCLUS).

É um micro-organismo originário da Amazônia que queima a folhagem causando sucessivos desfolhamentos prejudicando o crescimento, a produção de LÁTEX e em pouco tempo a árvore morre.  Até hoje a ciência não encontrou uma forma de eliminar ou controlar a doença, principalmente pelo porte elevado das seringueiras e pela alta variabilidade genética do MICROCYCLUS.

BELTERRA

Em 1932 a FORD enviou um botânico que, após estudos, sugeriu a troca da área da FORDLÂNDIA por outra em (mais para o norte e a 48 quilômetros de Santarém). Ali o solo e os ventos eram favoráveis e a umidade menor.

A vila foi instalada e alguns erros foram corrigidos e o projeto até que conseguiu ter um novo alento. Mesmo assim, a produtividade continuou baixa e os problemas ficaram: a escassez e a relação difícil com a mão de obra local,  reclamações constantes sobre alimentação, as casas nos moldes americanos e as restrições quanto aos costumes. Porém, a criatividade brasileira entrou em ação: e uma vila próxima substituiu a “ILHA DOS INOCENTES”.

O FIM DA FORDLÂNDIA

Após a II GUERRA MUNDIAL, a borracha sintética tornou-se mais viável, a FORD passou a se dedicar exclusivamente aos automóveis e terceirizou várias atividades.

Em 1945 HENRY FORD II assumiu a presidência da companhia e resolveu encerrar o projeto após U$ 20 milhões em prejuízos deixando para trás uma enorme infraestrutura no local (HENRY FORD que faleceu em 1947 de hemorragia cerebral). Em dezembro de 1945 o Governo brasileiro definiu a compra do acervo da COMPANHIA FORD INDUSTRIAL DO BRASIL:

● A FORD foi indenizada em aproximadamente US$ 250.000.

● O Governo brasileiro assumiu as obrigações trabalhistas dos funcionários remanescentes.

● O Governo brasileiro recebeu quatro escolas em BELTERRA e duas em FORDLÂNDIA, dois hospitais, estações de captação, tratamento e distribuição de água das duas cidades, usinas de força, 70 quilômetros de estradas; dois portos fluviais, estação de rádio e telefonia, duas mil casas para trabalhadores, trinta galpões, centros de análise de doenças e autópsias, duas unidades de beneficiamento de látex, as vilas de casas para a administração, departamento de pesquisa e análise de solo.

● Em FORDLÂNDIA: 1.900.000 seringueiras.

● Em BELTERRA: 3.200.000 seringueiras. Atualmente os prédios construídos pela FORD no local não têm a manutenção devida. Sofrem com a ação do tempo e do vandalismo. E ainda esperam pela conclusão do processo de tombamento…

Sugestão de Leitura

GRANDIN, GREG. Fordlândia. Ascensão e Queda da Cidade Esquecida de Henry Ford na Selva. Editora Rocco. Edição 1ª. São Paulo, 2010. 

SGUIGLIA, EDUARDO. Fordlândia. Editora Iluminuras. São Paulo, 1997.

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